15 de julho de 2020

DARKTHRONE - A BLAZE IN THE NOTHERN SKY (1992)


Texto de autoria de Marco Néo

A Blaze in the Northern Sky é o segundo álbum de estúdio dos noruegueses do Darkthrone, lançado em 2 de março de 1992 pela gravadora Peaceville Records. As gravações ocorreram durante o mês de agosto de 1991 no Creative Studio, e a produção é da própria banda.


Como já é praxe do blog, traremos um histórico da banda com vistas a inserir o leitor no contexto que os levou à criação deste que é considerado um dos mais influentes trabalhos da segunda onda do Black Metal.



As origens do grupo remontam a 1986, ano em que o baterista e vocalista Gylve Nagell formou o Black Death, banda de Death Metal, com os guitarristas Ivar Enger e Anders Risberget. No ano seguinte, 1987, influenciados por um fanzine underground dinamarquês de nome Blackthorn (por sua vez influenciado pela música Jewel Throne, do Celtic Frost), decidem mudar o nome da banda para Darkthrone. Com esse nome a banda, já acompanhada do baixista Dag Nielsen, grava uma demo, Land of Frost.

No início de 1988 Anders Risberget sai do grupo e Gylve decide adicionar à banda um sujeito que havia conhecido por amigos em comum, Ted Skjellum. Com essa formação o Darkthrone lança mais três demo-tapes, sendo que na última, Cromlech, lançada no final de 1989, o baterista, que sempre afirmou ter assumido os vocais por falta de capacidade dos outros integrantes, decide passar a função de vocalista para o “novo membro”.

Fenriz

A essa altura o Darkthrone tocava um estilo de Death Metal tradicional, com composições trabalhadas, que despertou o interesse da gravadora inglesa Peaceville. O interesse resultou em contrato e o consequente lançamento do primeiro disco da banda, Soulside Journey, em 1990.

Soulside Journey é um disco de Death Metal que segue a à época novíssima linhagem sueca de bandas como Nihilist/Entombed, Grave e Dismember. O disco foi, inclusive, gravado no Sunlight Studios, que produziu grande parte dos clássicos das bandas de Estocolmo. As letras das músicas mostravam, já naquela altura, o interesse dos membros pelo ocultismo.

Logo após o lançamento do primeiro trabalho o Darkthrone começou a compor músicas para um segundo disco de Death Metal, que seria intitulado Goatlord. Contudo, a essa altura, já no primeiro semestre de 1991, começam a frequentar a loja Helvete, de propriedade do guitarrista Euronymous, líder do Mayhem, e, instantaneamente influenciados pelo clima daquela cena ainda incipiente, decidem abandonar o alegado “comercialismo” do Death Metal de então, optando por um som mais primitivo, calcado em bandas da primeira onda do Black Metal, como Bathory e especialmente Hellhammer/Celtic Frost, além do extremismo dos trabalhos iniciais de bandas alemãs como Destruction e Sodom. Também passaram a utilizar-se do corpse paint para suas apresentações ao vivo e adotaram pseudônimos. Gylve se tornou Fenriz, Ivar adotou o nome Zephyrous e Ted passou a se apresentar como Nocturno Culto. Insatisfeito com as decisões e o novo direcionamento de seus companheiros, Dag Nielsen, ainda um fã de Death Metal, decide sair da banda.

Aqui, da mesma época, formação ainda com o baixista: Nocturno Culto, Dag Nielsen, Zephyrous e Fenriz.

Com isso, em agosto de 1991, acompanhados de Dag que, mesmo tendo saído, concorda em gravar as linhas de baixo, entram em estúdio para gravar A Blaze in the Northern Sky. A obra demoraria mais de seis meses para ser lançada pela Peaceville que, esperando um novo CD de Death Metal, mostrou-se surpresa e contrariada pelo novo direcionamento estético (em vez de uma capa mais elaborada, optou-se por uma foto preto-e-branco tirada à noite, com pouquíssima definição, do guitarrista Zephyrous orgulhosamente ostentando seu corpse paint) e, principalmente, musical dos noruegueses (a gravação foi considerada “sem peso”) e passou a pressionar a banda para que não soltassem o que considerava um “suicídio comercial”.

Cabe aqui uma última anedota: em meio à batalha com a Peaceville, Fenriz chegou a afirmar para os ingleses que, caso eles não quisessem lançar o álbum, Euronymous estava pronto para fazê-lo por seu próprio selo, Deathlike Silence Productions, que àquela altura já tinha em seu catálogo The Awakening, dos suecos do Merciless e se preparava para lançar o disco de estreia do Burzum. A gravadora capitulou e, em março de 1992, sai o segundo disco de estúdio do Darkthrone, um dos primeiros e mais influentes trabalhos daquela que ficou conhecida como a segunda onda do Black Metal.

Nocturno Culto

Faixas:

1. Kathaarian Life Code

O disco se inicia com uma introdução sorumbática, podendo-se ouvir ao fundo o que parecem ser orcs anunciando: “we are a blaze in the northern sky”. Todo esse clima culmina em um espasmo instrumental violentíssimo. E assim é apresentado ao mundo o Black Metal norueguês, gravação lo-fi e uma agressividade espantosa que não era sequer sugerida em Soulside Journey. As influências de Bathory e Hellhammer/Celtic Frost são fortes.

Um detalhe que não passa despercebido e que acompanha a carreira da banda até hoje são os acordes tocados em cordas soltas, contrastando com os riffs construídos com cordas abafadas por 99% do mundo metálico - inclusive por eles no disco de estreia - até então.

Quanto às letras, apesar de não fugirem da blasfêmia comum às outras bandas da época, mostram uma criatividade vários níveis acima de seus pares:

Desert... Night...
Coyotes feel the cold wave of the dark
Red eyes eat through
The vast nocturnal landscapes
A strong light – the only light
This is where he made sculptures
From the visions that created the force

Baphomet in steel for the flesh of cain
A throne made by remains
Of 12 holy disciples

2. In the Shadow of the Horns

Mais Celtic Frost, aqui ainda mais escancarado que na música de abertura, com um andamento bem cadenciado e riffs primitivos. A esta altura já nos acostumamos com a sonoridade lo-fi. Não, melhor, esse tipo de disco não soaria correto com qualquer outro tipo de sonoridade que não essa. Vale prestar atenção: aos 1min10s, temos uma introdução de Fenriz no melhor estilo dos shows de Frank Sinatra. “Nocturno Culto!!!”

Nas letras, mais blasfêmia, aqui beirando o surrealismo.

The triumph of chaos – has guided our path
We circles the holy Sinai – our swords gave wings
Invisible force of our abyssic hate
Our seeds boil as we gaze upon the new millenium

Weeping by the graves of the glorious ones
(so) the hardened frost melts away
Clouds gather across a freezing moon
I kiss the goat – witchcraft still breathes

3. Paragon Belial

Ainda que mantendo um ritmo mais cadenciado e uma batida primitiva, os riffs são o grande destaque dessa música, com acordes peculiares em sua dissonância e, ouso dizer, melódicos em alguns momentos. O disco tem apenas seis músicas, quase todas muito longas. Paragon Belial, com “apenas” 5min25s, é uma das mais curtas.

A blasfêmia aqui é mais filosófica.

The boiling sea beneath
The castle of faust
Belial finally comes forth

The ancient white light writings
Were just living men and their pens
You are the same, only in black.
Return with the knowledge
Of making your own god”

4. Where Cold Winds Blow

Aqui o ritmo volta a acelerar, em mais uma música com claras influências de Bathory dos dois primeiros discos. A letra fala de um guerreiro caído, relembrando suas batalhas e glórias.

I was, indeed, a king of the flesh
My blackened edges; still they were sharp
Honoured by the carnal herds
But asketh thou: closed are the gates?

My mind cut my winged weapons
And teeth that was my pride
And from the forest all would hear:
Wisdom opens the gate for the king”

5. A Blaze in the Northern Sky

A música título do disco é mais uma com andamento acelerado, uma atmosfera ríspida e violenta, contrastando com uma letra melancólica, lamentando a perda do orgulho nórdico, obliterado pelo cristianismo. No fim, a banda promete um retorno pagão. Como uma chama no céu do norte.

It took ten times a hundred years
Before the king on the northern throne
Was brought tales of the crucified one

Coven of renewed delight
A thousand years have passed since then –
Years of lost pride and lust

Souls of blasphemy,
Hear a haunting chant –

We are a blaze in the northern sky
The next thousand years are OURS

6.The Pagan Winter

Mais selvageria sonora no último som do disco. Um chamado para a guerra que trará de volta o paganismo para o norte. O inverno pagão. O disco termina com uma outro que repete a intro.

Horned master of endless time
Summon thy unholy disciples
Trained for centuries to come
Gather on the highest mountain
United by hatred...
The final superjoint ritual...

Considerações finais:

Mesmo com a briga entre o Darkthrone e a gravadora Peaceville e a consequente demora em ser lançado, A Blaze in the Northern Sky é considerado um dos pioneiros do Black Metal norueguês. Ao contrário das previsões pessimistas da gravadora, o disco, para os padrões do underground metálico, vendeu bem desde seu lançamento e se tornou um clássico não só do Black Metal norueguês mas do Metal como estilo, sendo influência para um número incontável de bandas ao redor do mundo.

Zephyrous

Conforme pesquisa realizada no site Wikipedia, “em sua resenha retrospectiva do álbum, Eduardo Rivadavia do AllMusic deu uma nota 5 de 5 estrelas, chamado-o de "um clássico cujos padrões sonoros lo-fi iriam indefensavelmente revigorar toda a cena do black metal". Valefor do Metal Reviews escreveu que "viria a definir o True Black Metal [...] com sua produção crua, riffs simples, capas em preto e branco... puro mal congelante". Channing Freeman do Sputnikmusic considerou o disco como "triunfante", uma mistura equilibrada de "produção gélida e cantos guturais" e "um senso de comunidade".

Em 2009, o IGN incluiu A Blaze in the Northern Sky em sua lista "10 Great Black Metal Albums", enquanto um artigo de 2007 da Decibel magazine o chamou de "o verdadeiro primeiro álbum de blackened death metal". A revista inglesa Kerrang! o classificou como "uma marca d’água escura para o Black Metal" e a música “In the Shadow of the Horns” como "sete minutos de uma desafiadora produção lo-fi, propósito gélido e simplicidade bruta”.

Após algumas apresentações esparsas em sua terra natal, a banda decide não fazer mais shows e se torna um projeto de estúdio, com seus membros tendo empregos “normais”.

Após o sucesso de A Blaze in the Northern Sky, o Darkthrone gozaria de uma longa e respeitada carreira que dura até os dias atuais.



Formação:
Nocturno Culto - Guitarra, Vocal
Zephyrous - Guitarra Base
Fenriz - Bateria, Backing Vocals
Músicos adicionais
Dag Nilsen - Baixo

Faixas:
01. Kathaarian Life Code - 10:39
02. In the Shadow of the Horns - 7:01
03. Paragon Belial - 5:24
04. Where Cold Winds Blow - 7:26
05. A Blaze in the Northern Sky - 4:57
06. The Pagan Winter - 6:35

Letras:
Para o conteúdo completo das letras, recomenda-se o acesso a: https://www.metal-archives.com/albums/Darkthrone/A_Blaze_in_the_Northern_Sky/612

Opinião do blog:
A Blaze in the Northern Sky é um divisor de águas no que se refere ao Black Metal. Mais do que qualquer outra banda da cena norueguesa, a aspereza do som da fase clássica do Darkthrone apontou o caminho a ser trilhado por grande parte, se não a maioria, da cena.

O que temos aqui é uma obra que, na época, gerou confusão entre os headbangers. Alguns abraçaram a proposta da banda de imediato, outros repudiaram a extrema crueza daquela sonoridade propositalmente tosca. Nada como o tempo para curar as feridas e nos mostrar o verdadeiro pioneirismo dessas seis músicas gravadas e lançadas de forma totalmente descompromissada por músicos que, mais do que o sucesso, queriam fazer aquilo que os agradava, sem se preocupar com opiniões exteriores, e lutar por sua visão artística.

O álbum tornou-se, juntamente com os dois próximos discos do Darkthrone, uma fonte inesgotável de consulta para jovens bandas que pretendem se arriscar no Black Metal, seja na rispidez das músicas, seja nas letras ora blasfemas, ora remetendo à mitologia pagã ou mesmo às histórias nórdicas. Não podemos, ainda, nos esquecer da parte estética. Ora, uma capa em preto e branco exibindo os membros de uma banda de Black Metal com toda sua parafernália e corpse paints tornou-se regra.

Não há muito mais palavras para descrever (ou elogiar) essa obra de arte. Se você já a conhece, não perca mais tempo e vá apreciá-la novamente. Se não a conhece, eis aqui uma grande oportunidade de conhecer um capítulo pivotal da história do Metal. Enquanto outros grupos da época se preocuparam em queimar igrejas e/ou cometer assassinatos, o Darkthrone teve participação fundamental na criação estética e musical da segunda onda do Black Metal. Indispensável.

2 comentários:

  1. Que surpresa agradável. Primeira banda de black metal do blog certo? Espero que venham muitas mais. Sobre o álbum, pra mim, o melhor da banda sem dúvidas. Minha música preferida do album é a primeira Kathaarian Life Code. Como você citou, este e os dois próximos "Under a Funeral Moon" e "Transilvanian Hunger" são grandes influencias. Quem sabe teremos uma resenha de algum em breve? E que venha também Immortal e Mayhem. Vida longa ao blog!

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    1. Muito obrigado Reinaldo! Darkthrone é de fato uma banda muito influente e cabe como uma luva na proposta do blog. Sugestões anotadas, forte abraço!

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